18/03/2020

Esta pandemia medrosa

Ai o medo a tomar conta de nós, o medo a empurrar-nos talvez na direção certa, talvez na direção errada. Não sabemos, não temos tempo para saber, o medo comanda... ou o medo ou a economia e o sol espreita. E os céticos aceitam mas riem, os descrentes tentam relembrar a ladaínha perdida no murmúrio dos dias, os medrosos finalmente enchem o peito para dizer, eu sabia que aí vinha, já tinha avisado e os outros, aqueles que não consigo definir, que já foram descrentes crentes, céticos aceitadores ou medrosos escondidos, esses continuam sem tempo para se colocarem à janela da vida e perceberem o que se está a passar. 


De repente, de um dia para o outro, disseram-lhes, amanhã muda tudo, ficam as crianças em casa e mudamos a forma de viver. Mas espera...espera.. isto não era apenas uma brincadeira? Isto não era apenas uma gripe? As crianças não infetavam ninguém, estávamos todos seguros nas palavras. Mas de repente as palavras ganharam outros contornos para além da realidade virtual, de repente começaram a soar a verdade. 




Abram as janelas, deixam o ar correr pela casa, oiçam os pássaros lá fora, deixem o ar correr pela casa, senão sufoco! Deixem de pensar que têm isto sob controle, que sabem o que estão a fazer e como vai ser. Não sabemos, simplesmente não sabemos. Foi criado artificialmente ou genuinamente, foi gerido por questões económicas; foi fantasiado para nos aterrorizar? Já não me interessa! Só quero que abram as janelas e deixem o ar correr, deixem-no circular pela casa, baralhar-lhes as folhas do papel e jogá-las no chão como na ventania crioula, que há 20 anos lhe baralhou a vida!

Abram as portas, as janelas, corram à varanda e acreditem que é possível. Deixem de me obrigar a, numa época que deveria de ser de quietude, ter de continuar a correr, ter de ser tudo o que já era e ainda mais, no mesmo número de horas. Percebam que não é possível mudar de um dia para o outro, percebam que temos de ir a pouco e pouco e não me assustem com tanta notícia... porque eu até sou medrosa mas também sou mãe, e as mães são todas muito corajosas. Não?

Ena, voltei à escrita e ao alívio de poder estar aqui, sozinha com as palavras perdidas.